Marco Serrabulho, 49
Diagnosticado há 14 anos
Sintomas, Diagnóstico & Evolução:
- Quais os primeiros sinais que fizeram pensar que alguma coisa diferente se passava?
Um polegar na mão esquerda que insistia em tremer quando me sentava a relaxar. Tentei desvalorizar na altura, mas persistia e começou a progredir para a mão.
- Pode descrever sucintamente o processo até obter o diagnóstico, dizendo quanto tempo terá demorado?
Talvez um pouco menos de um ano. Começou com o polegar que tremia, cerca de dois meses antes do nascimento do meu filho Miguel. Depois do nascimento, fui aconselhado a ir ao médico, uma vez que persistia. Tive uma consulta com uma neurologista que tentou desvalorizar, dizendo que deveria ser stress ou algum problema de coluna. Passou-me uns ansiolíticos e pediu para voltar um mês depois. Continuava igual. Pediu uns exames, entre os quais uma electromiografia, que não vinha com os resultados expectáveis. Sugeriu, então, que eu fosse visto por um colega especialista nessa área e encaminhou-me para quem continua a ser o meu médico atualmente. Uma consulta, alguns testes neurológicos e o diagnóstico que realmente indicava Parkinson, a ser confirmado algumas semanas mais tarde com uma TAC com contraste.
- O que sentiu quando o médico lhe comunicou que tinha Parkinson?
Na altura, já era uma perspectiva do que poderia ser possível. Curiosamente não senti medo, nem raiva, mas alguma apreensão. Tinha na altura dois filhos pequenos, (ainda viria a ter outro), e não sabia como isto iria influenciar no crescimento deles.
- Que explicações médicas recebeu sobre o facto de lhe ter sido diagnosticada esta doença?
Que era uma doença muito individualizada, e que havia pessoas que conviviam perfeitamente com a doença durante 20, 30 anos, e que existiam medicamentos e outras opções que ajudavam a manter uma vida perfeitamente normal durante muito tempo.
- As consultas médicas regulares dão-lhe as respostas orientação que precisa?
Nem sempre, mas esclarecem muitas dúvidas e ajudam na compreensão da doença, e também no ajuste da medicação a tomar. Ouvir o corpo é importante, e passar esse “sentir” ao médico é fundamental para que se possa ajustar a terapia.
- Desde que foi diagnosticado, que evolução vê nos sintomas e no estado geral da sua saúde?
O Parkinson tem muitos sintomas, e muitas pessoas nem associam muitos deles à doença. Diria que tem mais de 80 sintomas descritos, e desses cada pessoa tem o seu “lote”, que pode variar, tornando a doença muito individualizada, embora a prevalência de alguns seja claramente evidente. De repente, consigo enumerar uns quantos, que se foram acumulando ao longo dos anos, sendo que tem sido um processo lento, mas começando no tremor inicial, perda da motricidade fina, discinesias, distonia (dedos em garra), rigidez muscular, lentidão de movimentos, falta de força, falta de balanceamento dos braços ao caminhar, arrastar da perna, dificuldades em virar na cama, isto nos sintomas visíveis, nos não visíveis tenho os períodos on-off, urgência urinária, descontrolo intestinal, excesso de sudação, excesso de salivação, apatia, dificuldades de concentração, dificuldade em multitarefa, dificuldades na socialização, entre outros. Estes sintomas (e outros) foram-se instalando, lentamente, e por vezes são muito prevalentes, outras vezes, há fases em que diminuem ou mesmo desaparecem. Uma grande ajuda foi uma cirurgia que fiz ao cérebro, pelo menos a metade (à metade direita, que controla a metade esquerda do cérebro) denominada de PTT MRIgFUS, traduzida como Tractotomia Pálido-Talamica utilizando Ultra-Sons Focados guiados por ressonância magnética, que consistiu na destruição de um pequenos grupo de células (a interrupção de um feixe de células
que liga o tálamo ao globo palidus, estruturas bem no interior do cérebro), e que eliminou cerca de 90% dos sintomas no lado tratado e cerca de 70% globalmente, durante quanto tempo... não sei. Estou a ponderar fazer o tratamento ao outro lado.
Assimilação, Reação & Reorganização
- Como foi o seu processo de assimilação da notícia?
Não foi fácil, nunca é! É uma notícia que nos troca as voltas e coloca em causa toda a nossa noção de futuro, os sonhos, os projectos e depois a nossa própria auto-estima. Temos que repensar tudo, re-sonhar tudo, re-projectar e essencialmente readaptar. Não senti raiva, não explodi, acho que engoli tudo! Mas fui-me ajustando a esta nova realidade.
- Quanto tempo demorou até contar à sua família e pessoas mais próximas e como se sentiu depois de o fazer?
À família mais próxima, a alguns poucos amigos e à direção da escola onde lecionava, contei de imediato, mas pedi segredo. Depois, levei anos a assumir abertamente o problema. Na altura, considerei que era uma doença com um estigma social grande, o que sem me aperceber, só veio colocar nos meus ombros uma carga ainda maior, por tentar esconder a doença. No dia em que finalmente falei abertamente (neste caso, escrevi) sobre a mesma, foi um enorme alívio.
- Principais mudanças que fez na sua vida, desde que sabe que tem Parkinson
Por imposição da doença: que tipo de medicação faz? Faz algum tipo de exercício físico especial no dia-a-dia? Fez alterações nas rotinas ou nos planos familiares/profissionais?
As mudanças foram graduais, ao longo dos anos, e só lamento não ter mais informação para ter começado mais cedo, por exemplo a fazer exercício. Neste momento, tomo medicação específica para o Parkinson, 4 sinemet/dia e 1 amantadina. Tomo alguns suplementos, como mucuna, vitamina D, vitamina B1, ómega 3 e magnésio. Pratico corrida, entre 5 a 10 kms 3x por semana e alterei a minha alimentação, de acordo com o que considero ser mais saudável, mas sem extremos. A nível profissional tive que ir ajustando e tive que deixar de lecionar. Faço outras tarefas na escola, ao nível da gestão informática.
Por sua iniciativa com vista a uma melhor qualidade de vida: evitar situações de stress? Criar rotinas com família/amigos? Alterações do dia-a -dia profissional?
Evitar o stress, principalmente o stress contínuo, que causa desgaste, é uma das prioridades. Evitar situações e pessoas que nos causam stress é fundamental, pois é um dos principais fatores de agravamento da doença. Criar situações que nos deem prazer, principalmente onde haja interação social, é fundamental, e eu encontrei muito isso na corrida em grupo. Sentirmo-nos integrados, quer com a família, quer com os amigos, quer profissionalmente, é meio caminho para um percurso mais fácil.
- Que projetos gostaria de concretizar nos próximos anos?
Não tenho deixado de concretizar projectos, tenho feito algumas provas, incluindo a meia maratona de Lisboa, no ano passado abri, juntamente com a minha companheira, um salão de cabeleireiro onde ela agora trabalha, escrevi um livro que procuro agora editar e estou ainda a desenvolver um projecto de alojamento local. Isto obviamente, para além do meu trabalho na escola. A doença limita-nos, mas não nos define, é o que costumo dizer, e quando se procura, há sempre um caminho.
Integração: de Parkie para Parkie
- O que diria a alguém que tenha acabado de receber o diagnóstico?
Custa a encaixar e a aceitar, mas há coisas bem piores. Fiz coisas enquanto tenho a doença, que nem sonhava fazer antes disso. Acredito que me tornei uma melhor pessoa depois desta realidade. A doença mexe connosco, mas muitas vezes para melhor.
- O que acha que faz mais falta na comunidade, em termos de informação e de acompanhamento, para se sentir mais segurança e tranquilidade a viver com Parkinson?
Informação mais fiável e acessível. Numa doença destas, ter informação que nos ajude a fazer a gestão da mesma é meio caminho andado para uma vida feliz. Há pessoas que com a orientação certa e o comprometimento adequado se encontram melhor física e mentalmente passados dez anos do que no dia do diagnóstico.
- Se na sua zona de residência houvesse um Centro onde pudesse conversar, ter orientação psicológica, praticar exercício específico para pessoas com Parkinson Precoce, assistir a sessões de esclarecimento, etc, consideraria uma mais valia e teria interesse em participar?
Claro que sim
- O que gostaria de acrescentar?
Preparem-se para pequenas grandes alterações nas vossas vidas, o que não é necessariamente mau. Com a dose necessária de desporto, a alimentação correta, a suplementação adequada e uma boa higiene social, podemos viver uma vida perfeitamente normal e, acima de tudo, feliz. Vai ser uma montanha russa, agora podemos ir encolhidos com medo ou aproveitar o passeio. A escolha é nossa.